Jogo - O texto da imagem

A sua fúria representava uma ameaça a todos os seres em seu redor. Era triste e solitário porque a destruição que provocava, provocava a todos os seus amigos. Isso entristeceu-o ao ponto de não querer ter amigos que pudesse magoar. O resultado disso era a sua existência solitária e vazia, sem sentido, vivendo unicamente para destruir, e nunca para criar.

O seu sonho era ser um camponês de vida pacata, a semear a terra e a ver os frutos de seu trabalho assumirem a carne de um ser vivo. Sonhava com hectares e hectares de terra por semear, mas o seu sonho acabava sempre com ele a desplantar o plantado devido à euforia das correntes de ar em seu redor.

Isso tornou-o ainda mais solitário, e a solidão espevitou a sua ira.

Por cada vez que se irritava, lá ia uma aldeia a voar e as pessoas a fugir dele. "Olha o furacão!", e o pânico instalava-se através das imagens que a pequena caixinha transmitia. Quando sugava um aparelho desses ele investigava-o seriamente procurando saber como funcionava, mas ao invés disso ficou a conhecer Marte. O seu sonho passou então a ser um dia ir a Marte, onde teria toda a terra que precisasse para semear, sem que as pessoas fossem afectadas, onde poderia encontrar amigos nos vales profundos e nas montanhas majestosas.

Só que um dia a fúria foi tão grande que depois perdeu toda a sua força e se extinguiu, sem nunca dar por isso nem nunca ver o seu sonho realizado. Mas que seria de esperar? Ele era apenas um fenómeno natural.

Dois rostos sorriem-se entre olhares cúmplices, sem medos, sem vergonhas, sem ambições e sem esperanças.

Quem sabe dizer porque riem duas crianças? O menino apalpou a menina e ambos riem durante a brincadeira? O menino acabou de arrastar o corpo de um cão para a despensa da casa e sorri perante o alívio de uma missão cumprida? A menina foi até a uma esquina encostar-se por baixo da luz ofuscante de um candeeiro e sorri travessamente enquanto espera que uma limusine preta estacione? A menina acabou de limpar as ferramentas de trabalho e sorri ao ver que desta vez o tubo do lava loiças não precisa de ser desentupido por um canalizador que iria encontrar fragmentos de branco duro, e posteriormente a sua morte com a punhalada psicopata de um rosto encoberto pela negritude da loucura?

Porque riem duas crianças? Brincam, jogam futebol, andam de joelhos no chão, atiram pedras umas as outras, rodopiam em turbilhões de emoções divertidas. Nos parques infantis tocam-se com agulhas, e tomam as casas de banho para si onde brincam com limões e elásticos. Fazem travessuras, roubam as pobres televisões das suas salas de estar, convivem com outras crianças.

As crianças são matreiras, também. Felizes fazem outros infelizes; infelizes, fazem outros ainda mais infelizes.

Dizem que o rosto de uma criança ilustra o rosto da felicidade. Mas qual criança ilustra que felicidade?

Uma ninfa de cheiro a rosa será por ventura obra do imaginário de alguém. Alguém sequioso de paixão, de alguém ambicioso, alguém duro, severo, que corta a cara de outro alguém com uma chapada à velocidade do vento, mas que atravessa e cai e tomba de volta o braço vizinho da perna direita, porque ela é rosas, e nada mais. Ela é pétalas que voam em uníssono contra o vento, contra si. Toca-lhe com a pele suave de uma pétala na cara, e ele próprio o sente como se a rosa o queimasse.

Provocadora, inalcançável, jaz mesmo à sua frente, deleite para os seus olhos, mas nunca para o seu toque, porque ela é rosas, e nada mais.

Um turbilhão de pétalas em seu redor, um turbilhão de emoções fortes, e um cheiro feminino, tentador, a balancear no ar, torturando-o sadicamente. A sua revolta altera a órbita das pétalas, mudando a trajectória para mais longe e mais perto, num vai e vem hipnotizante a todos os homens.

O seu riso perdura. Pendurado no ar, o riso sedutor de uma rosa perdura, perdido entre o tempo e o espaço de forma leve, mas pesada. A vitória é alcançada, e a derrota inevitável. No ar, as pétalas voam pintando o ar de vermelho enquanto procuram uma forma sólida, e no chão, o vermelho corre pelo chão branco da escuridão.